Se você fizer uma pesquisa no Google simplesmente colocando a palavra felicidade, talvez se depare, numa primeira baciada, com os “resultados mais relevantes”, algo como 230 links. Se, no entanto, quiser incluir todos os resultados nessa pesquisa, irá encontrar 450 possíveis caminhos, sendo o último o anúncio de um livro chamado “Onde mora esta tal felicidade?”, que tem 100 páginas, nenhuma resenha, foi editado pelo Clube de Autores e está disponível gratuitamente. No meio, terá acesso a muitos cursos, seminários, livros, entre outros produtos que seriam capazes de lhe trazer felicidade. E o primeiro resultado de minha pesquisa – porque, lembremos, o Google busca os melhores resultados para mim, de acordo com meus gostos e preferências – traz a seguinte definição: “substantivo feminino; qualidade ou estado de feliz; estado de uma consciência plenamente satisfeita; satisfação, contentamento, bem-estar; boa fortuna; sorte”. E fecha com um exemplo: “para sua felicidade, o ônibus não atrasou, e ele pôde viajar”. Mas, afinal, quem não se pergunta sobre a felicidade?
Drummond dizia que ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade.
Platão filosofava que a felicidade estava na amizade – ao que parece concordar Cocteau, que, uns 2 mil anos depois, escreveu que a felicidade de um amigo deleita-nos.
Herculano acrescentaria que o segredo de ser feliz seria encontrar a nossa alegria na alegria dos outros.
Veríssimo – o pai, não o filho – afirmava que era a certeza de que a nossa vida não está se passando inutilmente.
Schopenhauer trazia a ideia de uma felicidade não material, que dependeria mais do que temos nas nossas cabeças, do que nos nossos bolsos. Assim também falava Aristóteles, para quem a felicidade não se encontra nos bens exteriores. E Millôr, com seu habitual sarcasmo, se contraporia aos dois ao dizer que o dinheiro realmente não dá felicidade, mas paga tudo o que ela gasta.
Freud, que, segundo se diz, sempre explica, explicava a felicidade como um problema que deveria ser resolvido individualmente.
Goethe definia a felicidade como um estado tão potente que, em sua plenitude, sentimos como se cada dia fosse uma vida inteira.
Shakespeare, que adorava um drama mais do que tudo, desmistificava a felicidade como meras ideias que carregamos dentro de nós.
Lord Byron, outro inglês que gostava de carregar nas tintas, comparava a felicidade à dor, dizendo que quando recordamos a felicidade, já não é mais felicidade, mas quando recordamos da dor, ainda é dor.
Victor Hugo condicionava a felicidade à convicção de que somos amados.
Rousseau colocava a felicidade na liberdade de não precisar fazer o que não se quer – o que Emerson complementaria ao dizer que, para cada minuto que você se aborrece, você perde sessenta segundos de felicidade.
Abraham Lincoln falava que quase sempre a maior ou menor felicidade depende do grau de decisão de ser feliz.
Russel via como parte indispensável da felicidade a carência de não possuir algumas coisas que desejamos.
Gandhi, cujas imagens disponíveis sempre mostram um homem magrinho, afirmava que a verdadeira felicidade é impossível sem verdadeira saúde, e a verdadeira saúde é impossível sem um rigoroso controle da gula.
Já para Tolstoi a felicidade verdadeira mesmo seria a missão de fazer o bem – o que o espírita Kardec parece concordar ao pregar que a felicidade será naturalmente proporcional em relação à felicidade que fizermos para os outros. O mesmo dizia Confúcio, condicionando a melhor maneira de ser feliz à contribuição para a felicidade dos outros. Einstein, que ficou conhecido por sua Teoria da Relatividade, mas era uma humanista de raiz, colocava quem considerava o prazer e a felicidade como um fim em si na categoria de indivíduos reduzidos a instintos de grupo, ou seja, a animais irracionais.
Nesse ponto, deixamos de lado o que dizem os outros para nos perguntar: e as abelhas que, sendo animais irracionais, sequer se perguntam sobre a felicidade, são felizes as abelhas?
Num final de tarde fresco de inverno, fiquei observando algumas abelhas que voavam em torno das flores de lavanda que plantei ao redor do ipé que ainda não floriu onde os restos de minha mãe foram enterrados.
Desculpe-me se a construção dessa frase possa, eventualmente, chocar algum leitor mais sensível. Eu já acho tudo profundamente belo e poético nela: as abelhas voando em busca do néctar das flores perfumadas da lavanda; o ipê em suspense à espera de um dia florir; a mãe que voltou para a terra e se transformou em alimento para a árvore que mais amava; a pessoa que observa tudo isso e se encanta por minutos que parecem intermináveis.
Tamanho encantamento talvez explique por que fiquei ali fotografando sem parar as abelhinhas como uma tentativa, pensei depois, de registrar minha felicidade por testemunhar algo tão profundamente singelo, diria até perfeito.
Como escreveu Guimarães Rosa no conto “Barra da Vaca”, do livro “Tutameia”, último livro publicado pelo autor, felicidade se acha em horinhas de descuido.
Para citar outro poeta brasileiro e que escolhi para abrir essa reflexão, talvez a felicidade seja como o amar, verbo intransitivo. A felicidade simplesmente é. O que significa que ela pode se dar até mesmo quando o ônibus atrasa e não podemos viajar.