Felicidade é um lugar que não existe

quarta-feira, 02 março 2011, 10:42 | Tags: , | 4 comentários
Postado por Fábio Betti 

Numa conversa entre amigos, alguém de repente disse que não aguentava mais ter que buscar a felicidade. “Será que não posso simplesmente viver na melancolia do clown?”, desabafou. E eu pergunto: que felicidade é essa que nos empurram goela abaixo?

Não há um padrão do que é ser feliz. Há muitos. Em todo lugar, somos bombardeados por mensagens com esses padrões. Alguns estão ligados a bens materiais, outros a atitudes, comportamentos. Qualquer que seja o padrão de felicidade, todos, de alguma forma, estão relacionados a outros padrões, como, por exemplo, o padrão de beleza. Só que também não há um padrão de beleza. Há muitos. E eles mudam ao longo dos anos, o que dá a dimensão da loucura que é persegui-los. Uma busca frenética e sem fim – pode-se chamar isso de felicidade?

Chega de discursos na terceira pessoa! A felicidade não é uma entidade separada de mim, por que então falo dela como se fosse? Aliás, só sei o que é felicidade quando a experimento em mim. E a felicidade que sinto é só minha, uma experiência única da qual só eu tenho o gostinho. Por isso, posso, sim, ser feliz na melancolia do clown! Quem disse que isso não é felicidade é porque não sabe o que é ser feliz na melancolia. Eu sei, porque já experimentei a melancolia e ela não me trouxe nem agonia, nem desconforto. Qualquer experiência de felicidade tem essa qualidade para mim, a qualidade do bem estar. Se não me sinto bem, pronto: não é felicidade o que sinto.

Simples assim. Complexo assim. Simples porque é meu corpo que fala o que é a felicidade, e meu corpo é sábio, mas tão sábio que funciona sem que eu precise fazer nada ou sequer dar-me conta de seus processos de autopoiesis. E complexo porque, muitas vezes, o que meu corpo define como felicidade entra em conflito com outras definições de felicidade, o que me faz, ocasionalmente, trai-lo. Mas como eu disse, meu corpo é sábio. Quando o traio, ele adoece para me mostrar que não preciso – na verdade, não devo – adotar uma felicidade que não é minha. Se faço isso com a intenção, deliberada ou não, de ser aceito pelo outro, os sinais de meu corpo tornam claro que essa estratégia não me traz felicidade, muito menos aceitação – quem, afinal, é aceito pelo outro: o ser que finjo ser ou o ser que escondo? Se escondo, óbvio, não sou visto e, portanto, não posso ser aceito.

Já não busco mais a felicidade em lugar algum. Não, não se trata de desesperança, muito menos de comodismo. Não procuro a felicidade, porque, todas as vezes que fiz isso, dei com os burros n’água. Para poder procurar a felicidade, tenho que definir um padrão de felicidade para ser atingido. Percebi que, quando isso acontece, viro refém desse padrão imaginário, idealizando a felicidade ao invés de já a ir vivendo. Pois é, sinto que ela já está aí, pelo visto, em lugar algum e em todo o lugar onde eu estiver inteiro, corpo e alma, coração e mente presentes e entregues à maravilhosa e única experiência do viver. Isso! Para mim, nesse exato instante em que escrevo, felicidade é estar vivo. Simples assim. Complexo assim.

4 comentários para “Felicidade é um lugar que não existe”

  • Cassio disse:

    Excelente texto. Simples assim. Grande abraço, Cassio

  • Ssmaia disse:

    Fabuloso! Adorei Fábio! Que o seu texto possa instigar as pessoas a refletirem sobre o significado real e subjetivo da felicidade, que é única e não precisa, necessariamente, estar relacionado aos “padrões” sociais! Criem seus próprios padrões e redescubra o que é felicidade para si!
    Um abraço!

  • Fabio Betti disse:

    A Amy é realmente um bom exemplo do julgamento alheio por meio de um padrão cultural de felicidade. Ela pode ser tão ou mais feliz do que qualquer pessoa, mas como não se enquadra num determinado padrão onde a felicidade é “aceita”, é simplesmente tachada de infeliz. Um outro ótimo exemplo da loucura que é o enquadramento da felicidade pode ser observado no filme Eqqus, de Sidney Lumet, com a fantástica interpretação de Richard Burton como o psiquiatra em crise frente a um paciente que encontra a felicidade fora de quaisquer padrões.

  • gizeli disse:

    Fabinho, nem sei o que dizer do teu texto.
    Talvez saiba sim… Me fez sentir feliz!!!

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